sábado, 6 de fevereiro de 2016

No 90º aniversário do Mein Kampf, de Hitler (4).

 
 
 

 

 

A história editorial do Mein Kampf

        

O programa político de Adolf Hitler, publicado em dois volumes, o primeiro em 1925 e o segundo em 1926, [1] foi escrito pelo futuro Führer quando este se encontrava preso na prisão-fortaleza de Landsberg am Lach (Baviera), após a condenação pelo tribunal a cinco anos de prisão como um dos promotores do putsch iniciado com uma manifestação que ocorreu na Bürgerbräukeller, uma cervejaria de Munique, em 8 de Novembro de 1923, que em pouco tempo seria destroçado e os seus principais instigadores encarcerados. Hitler e alguns dirigentes do partido nazi - de imediato dissolvido – seriam julgados a partir de 26-II-1924, e condenados em 1-IV desse ano por alta traição, cabendo ao futuro Führer uma das pena mais pesadas, de cinco anos por alta traição, tendo os quarenta detidos putchistas sido encarcerados em Landesberg, conseguindo embora Hess e Goering fugir para o estrangeiro.[2]

A mansuetude do sistema carceral permitia aos putschistas, no entanto, uma vida de certo luxo, tomando, por exemplo, Hitler, o seu pequeno-almoço na cama. Lia abundantemente, recebia e conversava com visitantes e amigos, o que lhe permitiria dizer que nunca na sua vida fora tão bem tratado num cárcere. Este remanso tranquilo permitir-lhe-ia entregar-se com entusiasmo, com a ajuda inicial do seu amigo íntimo Emil Maurice (1897-1972), guarda-costas e motorista,[3] e depois, sobretudo, a dada pelo seu fiel amigo Rudolf Hess[4] – entretanto capturado e levado também parta Landsberg -, na elaboração da sua obra, a bíblia nazi. Nesses meses de detenção, Hitler ditaria a sua obra de ódio e racismo nacionalista que sairia mais tarde, em 1925 e 1926, em dois grossos livros. Nesses meses de detenção, que terminariam pouco antes do Natal de 1925, Hitler ditaria a sua bíblia que sairia mais tarde, em 1925 e 1926, em dois grossos livros, beneficiando ambos os volumes de revisões e correcções de alguns colaboradores, que acabámos de citar (Maurice, Hess e ainda o Pe.Stemple, adiante  referido com mais detalhe).

 
 
 
Hermann Goering
 

O editor de Hitler

O título inicial que Hitler deu ao seu manifesto ideológico e autobiografia fora Quatro Anos e meio de Combate contra Mentiras, Estupidez e Covardia, enunciado que o seu companheiro de prisão e amigo Max Amann propôs que fosse substituído, por motivos comerciais, por Mein Kampf (O meu Combate). Amann, nascido em Munique em 24-XI-1891, católico, sargento durante a grande guerra, no regimento bávaro em que Hitler combatera, recebera a Cruz de Ferro pela sua actuação emo combate, seria um dos primeiros filiados no NSDAP (1921), sendo depois secretário-geral do partido (1921-23), dirigindo desde 1922 a Eher Verlag, a editora oficial dos nazis, pertencente de início a Franz II. Participante no putsch da cervejaria bávara, desde 1920, editor e director do diário muniquense Völkischer Beobachter, mais tarde, do semanário Illustrierter Beobachtar, mensário que se publicou desde 1926, além de ter acompanhado em Landsberg a redacção das memória/panfleto de Hitler, Amann seria depois o responsável editorial pelas inúmeras edições dos dois volumes do M.K., assim como do sua versão compacta num só volume (1930), sendo, nessa medida, o responsável pelo enriquecimento do Führer com os direitos autorias dessa obra que era a bíblia do nazismo, além de que foi designado, em 1933, presidente da Câmara de Imprensa do partido nazi, controlando 80% da imprensa do Reich, além de que velava ainda pela censura dos media do regime. Reichsleiter de toda a imprensa oficial, Amann, arquétipo do burocrata do III Reich, era um homem brutal, de escassos talentos como orador ou jornalista, até porque mandava escrever os artigos que se publicavam com o seu nome. Em 1948 foi condenado a 10 anos de trabalhos forçados, falecendo em Munique, em 30-III-1957.[5]  

 
Hitler com Max Amann
 
As tiragens das edições do Mein Kampf (1925-1945)
 
          Embora Amann esperasse que se vendessem cerca de 230.00 exemplares no lançamento desse livro, uma vez que o julgamento dera a Hitler uma projecção publicitária retumbante graças à presença dos media alemães e europeus ante os discursos demagógicos e inflamados do réu durante os 24 dias do processo – o italiano Corriere della Sera, de 28-II-1924 sublinhava que a defesa tendia a transformar os acusados em acusadores, culpando von Kahr e von Lossow, que eram apenas testemunhas de acusação -, a verdade é que em 1925  a espessa obra de 400 páginas registou apenas uma venda de 9.473 exemplares, tanto mais que cada um custava 12 marcos, ou seja, o dobro dos livros alemães editados na época. Em 1926 publicava-se o segundo volume do M.K., de que se venderam 5.067 cópias, continuando as vendas a diminuir, facto que só se alterou com os progressivo e surpreendentes sucessos eleitorais do partido nazi nos anos seguintes, de tal modo que Amann optou por uma edição compacta, num só volume, em 1930, a 8 marcos apenas, que registou nesse ano uma venda de 54.086 cópias e, em 1932, 909.351, atingindo 300.000 de exemplares no ano em que Hitler foi nomeado chanceler.[6] Ao todo, ter-se-iam vendido na Alemanha 10 milhões de exemplares deste livro. Como resume o caso Karl Dietrich Bracher, um dos mais competentes estudiosos do fenómeno nazi:
“O putsch de farsa fizera de Hitler um mártir; o homem sem nome tornou-se conhecido e para muitos era o símbolo da sua busca cega de mudança. O seu primeiro e único livro publicado estava feito de modo a amedrontar qualquer pessoa sensível; primeiro vendeu-se pouco, mas em 1933 já vendera 300.000 exemplares e finalmente foi disseminado como a bíblia do III Reich. Muitos houve que, aquecidos num falsa sensação de superioridade, se recusaram a tomá-lo a sério. Falharam em reconhecer que os violentos planos para o futuro candidamente discutidos eram planos que se tornariam uma terrível realidade. E embora os que seguiam Hitler não incluíssem muitos leitores, ele valeu apesar disso ao seu autor substanciais proventos autorais. Em breve era dono de uma grande limousine e mais tarde de uma casa magnífica em Obersalzburg, perto de Berchtesgaden (…).”[7]
Em suma, Amann conseguira fazer de Hitler um autor de um sucesso editorial tal que ficaria rico com os direitos auferidos com a sua única obra,[8]  tanto mais que aquela demente bíblia racial e ultranacionalista era oferecida como prenda pelo Estado, desde 1936 a 1945, aos noivos quando se casavam. Foi ainda essa fortuna obtida como este best-seller oficial e de leitura obrigatória que o Führer, como se viu, compraria um retiro montanhês em Berghof, um chalet no cume do Obersalzberg, sobre a cidade de Berchtesgaden.[9] Apesar de ter vendido cerca de um milhão de exemplares em 1933 e 4 milhões em 1940, o M.K. era, paradoxalmente, um livro que quase ninguém lia, tanto pelo seu estilo empolado como pela ausência de estilo ou qualidades literárias, além de pejado de inúmeros erros gramaticais – o escritor alemão Lion Feuchtwanger teve a paciência de inventariar os milhares de erros no texto do Mein Kampf, apesar das diversas correcções que nele operaram os referidos revisores, o Pe. Stempfle e o crítico musical Czerny[10] –, esse indigesto panfleto vociferante e repassado de ressentimento, cuja escassa atracção de leitores Otto Srasser explicou nesta passagem do seu livro Hitler e Eu:
“Estávamos no congresso do Partido em Nuremberga, em 1927. Eu era membro do partido há dois anos e meio e encarregado do relatório. Citei algumas frases d o Mein Kampf, o que provocou uma certa sensação. À noite eu jantava com alguns camaradas do partido, Feder, Kaufmann, Koch e outros, os quais me perguntaram se eu tinha verdadeiramente lido o livro e nenhum deles parecia conhecer. Confessei ter extraído algumas frases significativas dele sem me ter ocupado de modo algum do texto, Foi uma hilaridade geral, de modo que se decidiu que o primeiro a chegar que tivesse lido o Mein Kampf pagaria a conta dos outros. Gregor Strasse, interrogado à entrada, respondeu com um não sonoro, Goebbels sacudiu a cabeça acabrunhado, Goering soltou um grande risota, o conde Reventlov desculpou-se dizendo que tinha falta de tempo. Nenhum contudo estava ao corrente da sanção se confessasse conhecer o Mein Kampf. Mas ninguém, lera o livro do chefe e cada um teve de pagar a sua conta.” [11]
 
 
Otto Strasser
 
 
 
Esta anedota divertida contada por Otto Strasser comprova até que ponto aquele best-seller era o livro mais ignorado da Alemanha, até entre nazis. A verdade é que, apesar de ser um crescente best-seller editorial, o Mein Kampf era um livro que raros liam, mesmo entre os seguidores do Führer. De qualquer modo, o Mein Kampf fez de Hitler o autor mais bem pago da Alemanha do seu tempo. Já Winston Churchill, escrevendo a sua A Segunda Guerra mundial, com a vantagem considerável de olhar para trás e poder abarcar com uma visão ao mesmo tempo mais ampla e melhor informada de todo o convulso, trágico e mortífero processo da tomada de poder na Alemanha pelos nazis e as tão cruentas guerras entre Gog e Magog dali resultantes, redigindo uma dezena de páginas brilhantes à carreira do Führer que se suicidara no Bunker, lembrava que os meses passados por Hitler em Landsberg tinham sido para lhe permitirem completar em esquema Mein Kampf, “um tratado sobre a sua filosofia política dedicado aos mortos do recente putsch. Tudo estava lá: o programa do ressurgimento alemão, a técnica de propaganda do partido; o plano para combater o marxismo; o conceito dum Estado nacional-socialista; a legítima posição da Alemanha na cúspide do mundo. Aqui estava o Corão da fé e da guerra: bombástico, ver, informe mas carregado da sua mensagem.
 
 
 
Colagem de John Heartfield
 
 
 
A tese essencial do Mein Kampf era simples. O homem é um animal que combate; portanto, a nação ou a raça, sendo uma comunidade de combatentes, é uma unidade de combate. Todo o organismo vivo que deixa de combater está também condenado à extinção. A capacidade combativa duma raça depende da sua pureza. Por isso a necessidade de se livrar dos elementos estrangeiros. A raça judia, devido à sua universalidade, tem a necessidade de pacifismo e internacionalismo. O pacifismo é o pecado mais mortal, porque significa a rendição da raça na luta pela existência. O fim último da educação está em produzir um Alemão que possa ser convertido com o mínimo de treino num soldado.(…). Nada poderá ser afectado pelas virtudes burguesas e paz e ordem. O mundo está agora a mover-se em direcção a uma total convulsão e o novo Estado Alemão deve ver nisso que a raça está pronta para as derradeiras e maiores decisões.”[12]
 
  João Medina
 


[1] I. Kershaw, na sua monumental biografia de Hitler, afirma que o primeiro volume do M.K. saiu em18-VII-1925 e o segundo em 11-XII-1926 (op. cit. p.242). Outros estudiosos e biógrafos de Hitler fornecem  datas diferentes ou não as mencionam: em 1925 e 1927, diz  Eberhard Jäckel, Hitler Ideólogue, 1973, p.7. James Taylor e Warren Shaw, The Third Reich Almanac, Nova Iorque, 1997, p.212, dizem-nos publicados em  1925 e 1928. Louis Snyder, na sua bem elaborada Encyclopedia of the Third Reich,, Iorque, Marlowe & Company,1989, p.24, dá as datas de 1925 e 1927. Robert  Wistrich, Wer war Wer im Dritten Reich. Ein biographisches Lexikon, Francoforte, Fischer Verlag Taschenbuch, 1988, não indica datas, limitando-se a referir Hess como o seu escriba (p.174). Alan Bullock, no seu conhecido estudo Hitler. A Study in Tyranny, Nova Iorque, Bantam Books, 1958, refere o M.K., o seu editor Amann e a colaboração de Hess, mas não menciona datas desta obra (p.53).  William L. Shirer, em Le Troisième Reich des Origines, Paris, Stock/Livre de Poche, 1969, ocupa-se do M.K, e faz a sua história editorial, dando 1925 como data o primeiro volume e 1926 como a do segundo tomo (pp.108-111). No seu já referido Hitler, vol.I, Joachim Fest historia a génese, conteúdo e edição da obra, mas aponta apenas 1925 como sendo o ano em que Hitler escreveu o primeiro vol. (pp.265; análise da obra: pp.242-265).
[2] Hermann Goering (Rosenheim, Alta Baviera, 1893 –Nuremberga, 15-X-1946), filho de um funcionário colonial  na Namíbía, famoso piloto da força aérea durante a grande guerra, na célebre esquadrilha Richtoffen, tendo recebido várias medalhas e a ordem de “Pour le mérite”, foi depois piloto privado na Dinamarca e na Suécia, casando-se aqui com a baronesa Carin von Kantzow, indo viver para a Baviera, matriculando-se  na Universidade de Ciências Económicas, onde se dá com Hess, travando conhecimento com Hitler em 1922, entrando para o NSDAP e sendo nomeado chefe da SA em Janeiro de 1923. Ferido no golpe da cervejaria, foge para a Áustria, depois na Itália e, por fim, de novo na Suécia, onde os tratamentos médicos à sua ferida do putsch de 1923 o tornam morfinómano. Amnistiado em 1928, regressa à Alemanha, sendo um dos 12 deputados nazis eleitos então para o parlamento, de que seria presidente em 1932 graças ao sucesso eleitoral do partido nazi, entrando para o primeiro governo de Hitler quando este foi feito chanceler por Hindenburg (1933). O seu nome foi apontado como o verdadeiro instigador do incêndio do Reichstag (27-II-1933), atribuído a um holandês com ligações com o comunismo, Marinus van der Lubbe e muitos outros comunistas, desde deputados marxistas do Reichstag a estrangeiros como Georgi Dimitrov (1882-1949) - julgado em Leipzig e por fim inocentado, num  processo que atraiu a atenção mundial e no qual o réu teve a coragem de confrontar directamente o próprio Goering em defesa da sua inocência, acabando por ser  absolvido e autorizado  a abandonar a Alemanha em 1934, indo então para URSS, vindo mais tarde a ser primeiro-ministro da Bulgária comunista desde 1946), detidos aliás por Goering como chefe da polícia de Berlim. Quanto a Marinus van der Lubbe, foi executado em 10-I-1934. Goering conhece entretanto uma fase de rápida promoção no III Reich, detendo, entre outros cargos políticos e policiais, o de ministro Prussiano do Interior, inaugurando ainda o primeiro campo de concentração em Oranienburg, cabendo-lhe dirigir em Berlim, em Junho de 1934, as acções da “Noite das Facas Longas”, sendo nomeado comandante supremo da Luftwaffe (1935), que, em 1939, seria a mais poderosa força aérea de combate mundial, ocupando doravante no regime hitleriano o lugar de número dois do regime. Tendo morrido (1931), a sua primeira mulher, Goering voltaria a casar-se(1935), agora com a actriz Emmy Sonnemann. Em 1936 é feito Feldmarechal do Reich, sendo o delfim designado do Führer. Nos anos 1940-41, na batalha da Inglaterra, a Luftwaffe é progressivamente anulada e as dificuldades da economia alemã de guerra agravam-se, apesar de Goering dirigir o empório industrial e petrolífero das “Goering-Werke”, perdendo o marechal progressivamente o poder, em proveito de outros sátrapas do regime, como Speer, o novo ministro do Armamento, Goebbels, o chefe da propaganda, ou Himmler, o dono da maquinaria todo poderosa da SS, um verdadeiro Estado policial dentro do Estado, dotada ainda de forças especiais combatentes, as Waffen-SS (SS Combatentes), além dos campos de extermínio genocidário e dum Ofício de Reinstalação da Raça, o RuSHA (Rasse- und Siedlungshauptamt, departamento destinado a conceder certidões de aurianidade aos candidatos a lugares na SS, além, de estabelecer homens seus nos territórios conquistados a Leste: veja-se Heinz Hühne, The Order of the Death’s Head, Nova Iorque, Ballantine Books, 1983 (maxime pp.87-105, 150-181,e 166-9 e 176-7). Goering retira-se então para o seu palácio de Carinhall (nome dado em homenagem à primeira mulher), coleccionando obras de arte espoliadas por toda a Europa ocupada, usando uniformes barrocos e entregando-se a uma vida de orgias, álcool e droga. Como Goering procurasse negociar a paz com os Aliados, Hitler demite-o das suas funções, excluindo-o do partido e ordenando o seu fuzilamento. Preso pelos americanos (9-V-45), tenta em vão falar pessoalmente com Dwight Eisenhower, sendo julgado em Nuremberga e condenado à morte pela forca, execução que consegue evitar, duas horas antes de subir ao patíbulo, suicidando-se (15-X-46) com um ampola de cianeto de potássio adquirida a um dos seus carcereiros. Veja-se Richard  Overy, Goering. Hitler’s Iron Knight, Londres e Nova Iorque, I.B. Taurus, 2012. Quanto às inúmeras obras de arte que Goering abundantemente espoliou, veja-se Jean-Marc Dreyfus, Le Catalogue Goering, Paris, Flammarion, 2015 (pref. de Laurent Fabius).
[3] Emil Maurice (Wetermoore, 19-I-1897 – 6-II-1972), um boémio e relojoeiro que se tornaria participante em diversos assassinatos nazis, tanto nas matanças da “noite da Facas Longas “ de Junho de 1934 e na misteriosa morte de Geli Raubal (18-IX-1931), sobrinha e amante do Führer, associado ainda a um bando de criminosos que levaria à eliminação do antigo Pe.Bernhard Stempfle, caso também relacionando com a morte de Geli. E.M. foi designado SS-Oberführer em 1937.
[4] Utilizamos duas traduções do M.K., de duas inglesas, uma outra francesa e, por fim, uma portuguesa: -My Struggle, Berlim, 1933, facsímil editado por Market Ashok Vihar, Delhi, 2015. -Mein Kampf, introdução de D.Cameron Watt (1928-2014), trad. de Ralph Manheim, Londres, Pimlico, 1994,  recentemente vertida para português em 2 vols, Mein Kampf/A minha Luta, introd. E notas de D. Cameron Watt, Lisboa, Glaciar, Lisboa, 2016, trad. de Maria Lin de Souza Moniz, 2 vols. , introd., vol. I, pp.11-67. -Ma Doctrine, Paris, Libraire Arthème Fayard, 1938, ed. não integral, mas acrescentada de alguns discursos de A.H., em Coblença, de 26-VIII-34, Sarrebrück, 1-III-35, Karlsruhe, 12-III-36, Francoforte, 16-III-36, Nuremberga, Setembro de 1936 e Setembro de 1937, bem como uma carta a Mussolini, de 2-III-1938, sendo o essencial do volume extraído do M.K., anotando o editor, no seu “Aviso”, que publica esta obra  “com uma preocupação de imparcialidade absoluta e cujo autor autorizou oficialmente a publicação” (pág. s.n.). Sempre que citarmos qualquer destas edições, indicaremos qual a que usou em cada caso. Sobre o M.K., veja-se: -Werner Maser, Hitler’s “Mein Kampf”: an Analysis, Londres, Faber and Faber, 1970. -Eberhard Jäckel (nasc. em 1929), Hitler Idéologue, Paris, Calmann–Lévy,1973 (título da ed. alemã: Hitlers Weltanschauung, 1969). -Antoine Vitkine, Mein Kampf, Histoire d’un Livre, 2013, obra referida na nota seguinte.
[5] Os Aliados, após o fim da segunda guerra mundial, deram ao governo da Baviera todos os direitos editoriais do M.K., durante 90 anos contados a partir da primeira edição, o que levaria o Instituto de História Contemporânea de Munique a preparar uma edição crítica comentada por historiadores e enquadrado no seu tempo, com vista ao momento em que a obra caísse no domínio público. Em França, a Fayard prometeu editar uma tradução francesa com um aparelho historiográfico, de modo a anular o efeito nocivo de reeditar semelhante panfleto de ódio racista. Em França, em 2015, o deputado europeísta francês Jean-Louis Mélanchon escreveu uma carta indignada à responsável da editora Fayard, perguntando: “Ele não nos enlouqueceu suficientemente, então porquê reeditar Hitler”, acrescentando que, “ havendo já uma Marine Le Pen, não era preciso voltar a publicar textos do Führer. ” Veja-se o artigo “«Mein Kampf», quatre-vingt-dix ans après…”, semanário L’Observateur, nº 2661, de 5-XI-2015, pp,10-11, ilustrado . Sobre este mesma questão e ainda as 3 edições francesas do M.K , antes da ocupação da França, veja-se o artigo de Pierre Assouline, “Pourquoi il faut publier Mein Kampf”,  Paris, Le Magazine Littéraire, nº 562, Dezembro de 2015, pp.3-5, com a reprodução das três edições gaulesas da obra nos anos 30, antes da França ser ocupada pela Alemanha nazi, p.4. O tema das versões do M.K. na França foi desenvolvido por Antoine Vitkine no seu Mein Kampf, Histoire d’un Livre, Paris, Champs, 2013, maxime  pp.134-148. Antes da ocupação da França, a Librairie Arthème Fayard, que publicav o jornal maurrasiano e anti-semita Candide, editora dirigida por Jean Fayard, assistido por Pierre Gaxotte, edita em 1938 (e depois, já na Ocupação, em 1942) uma obra que selecciona textos do M.K. e discursos de Hitler posteriores; citaremos esta reedição da obra, Ma Doctrine, Paris, Libairie Arthème Fayard 1942, na qual se incluem as passagens anti-francesas do M.K. de Hitler (pp.250-254, assim como discursos oficiais do Führer de anos posteriores são referidos explicitamente (v.g., o de Coblença, de 1935, sobre a devolução do Sarre à Alemanha, p.255 e ss). Citaremos a versão portuguesa desta obtra, Mein Kampf /A minha Luta, Lisboa, Edição Glaciar, 2016, 2 vols., trad. feita por Maria Lin de Souza Moniz, a partir da trad. inglesa, com introdução e notas do historiador D, Cameron Watt (1928-2014), de 1969, revista em 1991.
[6] Cf. William Shirer Le Troisième Reich, vol.I, p.109. E Karl Dietrich Bracher, The German Dictatorship. The origins, structure and effects of National Socialism, Nova Iorque e Washington, Praeger Publishers, 1979, p.129.
[7] K. D. Bracher, The German Dictatorship. The Origins and Effects of National–Socialism, introd. de Peter Gay (pp.VII-IX), N.Iorque e Washington, Praeger Pubslsihers, 1970, p.129. Karl Dietrich Bracher (Estugarda, 13-III-1922), estudou na Universidade de Tubinga (1948) e, depois da guerra, na de Harvard (1949-50). Servira na Wehrmacht durante a guerra, foi capturado pelos americanos na Tunísia (1943), ficando preso no Kansas, nos E.U.A.. Começando como historiador de Roma, orientou-se depois para a temática da ditadura alemã, da derrocada da República de Weimar e da ascensão de Hitler ao poder, escrevendo algumas das obras mais importantes da historiografia democrática germânica do após guerra: A Queda da República de Weimar (1955), A Tomada do Poder pelo Nacional-Socialismo (1960), de colaboração com Wolfang Sauer e Gerhard Schultz), A Ditadura alemã (1969) e A Idade das Ideologias (1982). Participou na “querela dos historiadores” de 1986-88, embora tomando numa posição lateral, criticando as teorias de Ernst Nolte sobre o Fascismo e elogiando os estudos de Joachim Fest sobre Hitler.
[8] Um segundo livro de Hitler, escrito depois de 1928, teria ficado por publicar, sendo editado em 1960 na Alemanha, com o título de Hitlers Zweites Buch (Segundo Livro de Hitler), havendo porém dúvidas de que se trate duma obra genuína.
[9] Essa primitiva vivenda foi engrandecida como reduto inexpugnável, rodeado de instalações de segurança onde 20.000 militares velavam pelo sossego e solidão do Führer. A metamorfose do modesto tugúrio campestre no sudoeste bávaro, perto da fronteira austríaca e a cerca de 80 kms de Munique, precisou de cinco anos de trabalho escravo para se transformar no mítico “ninho de águias” em forma de cogumelo, rematando numa torre a que só por elevador se podia ali aceder – era este o “ninho de águias” propriamente dito –, sob o qual havia treze pisos escavados na montanha, só havendo um acima dos andares subterrâneos, onde Hitler recebia as suas visitas mais íntimas, acompanhado de Eva Braun e do seu cão Blondi (que seria morto, quando o dono se suicidou no Bunker de Berlim, em  30-IV-1945)  e passava as longas noites de insónia, fazendo quase nenhum exercício, monologando como sempre e levando um regime alimentar severamente vegetariano, além de nunca beber vinho nem fumar . Uma estrada especial conduzia de Berchtesgaden a Berghof. Sobre a morte de Blondi no Bunker de Berlim, veja-se Joachim Fest, Inside Hitler’s Bunker. The last Days of the Third Reich, Londres, Pan Books, 2005, ilustr., pp.105-6 (o cão pastor alemão de Hitler foi morto com cianeto de potássio e os seus sete filhotes a tiro). Hitler gostava muio de cães, como lembra nos seus propos de table: ver Hitler Secret Conversations. 1941-1944, Nova Iorque, Signet Books, 1981, introd. de H.R.Trevor-Roper,  pp.235-6 (o seu cão Foxl na grande guerra) , 249 e 534 (Blondi era vegetariano).
[10] Lion Feuchtwanger (Munique, 1884­ – Los Angeles, EUA, 21-XII-1958), autor, nos ano 20 e 30, de famosos romances históricos, fugido das Alemanha nazi para Londres, em 1934 e, depois, para os Estados Unidos devido à sua ascendência judaica. Não deixa de ser curioso que uma das peças de teatro de Feuchtwanger, depois transformada, em 1925 em romance de grande sucesso, Jud Süss (O Judeu Süss), retratasse a vida de Joseph Süsskind-Openheimer, famoso financeiro judeu que fora director das finanças do duque de Würtembrg (1698-1738), acusado, após a morte do duque católico, de diversos delitos que o levariam a ser preso e exposto numa gaiola pelos protestantes, seria transformado numa figura odiosa pelo cineasta nazi Veit Harlan (1899-1965), no filme Jud Süss (1942), com a ajuda do ministro da propaganda Goebbels, como mostra de uma figura tipicamente judaica, cobarde, traiçoeiro e hipócrita, obra de cinema que teve enorme sucesso na Alemanha nazi e foi exibida em todos os países ocupados, como na França de Pétain, sendo obrigatório que fosse visto por todos os SS, membros da polícia e guardas dos campos de concentração, já que o filme proclamava que os judeus eram “ratos que causam a ruína do país, destruindo os bens e os alimentos dos homens” (sobre V.Harlan e Erich Waschnek, veja-se  Adelin Guiot e Patrick Restellini, L’Art nazi. 1933-1945, pref de L. Poliakov, Bruxelas, Editions Complexe,1983, pp. 156 e 160 (cartaz do filme de  E.W., Die Rothschilds) e 163 (foto do cartaz do J.Süss  à entrada do cinema Pathé Palace, em Paris). Sobre o significado especial da “Noite de Cristal”, veja-se o que diz  George Mossse na sua Intervista sul Nazismo (entrev. dada a Michael Ledeen), Roma, Arnoldo Mondadori Editore, 1993, pp.78-81), na qual G.M. diz que este episódio violento de 1938 foi um  “sinal dado por Hitler” no sentido de como tencionava  resolver a questão judaica, dando aos judeus, já destituídos de cidadania pelas leis anti-semitas de 1935, “uma punhalada no coração”(p.82).
[11] O. Strasser, Hitler et Moi, pp.68-69. Otto Strasser (Windsheim, Francónia, 10-IX-1897 – Munique, 27-IV-1974), irmão de Gregor Stasser (que seria assassinado por ordem de Goering, durante a Noite das Facas Longas, em Berlim, 1934), representante da ala esquerda do nacional-socialismo, seria expulso do NSDAP em 1930, fundando então com o ex-SA Walter Stennes uma dissidência, A União dos Socialistas Nacionais Socialistas Revolucionários, mais conhecida como a “Frente Negra”, exilando-se depois em Praga e, por fim, no Canadá, donde regressou ao seu país em 1955. Quanto a W.Stennes, exilou-se para a China, sendo comandante da guarda pessoal do general Tchang-Kkai-Check.
[12] Winston Churchill (1874-1965), The Second World Ware. Abridged edition with an epilogue on the years 1945 to 1957, Londres, Pimlico, 2002, pp.26-27  (este capítulo intitula-se “Adolf Hitler”, pp.24-32).

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