quinta-feira, 18 de abril de 2024

Argélia: o tempo da fraternidade? (19).

 


As gargantas do Chiffa, 70 quilómetros ao Sul de Argel, nos contrafortes das montanhas do Atlas, distinguem-se pela sua beleza agreste.

Ponto exótico das gargantas é o chamado Ruisseau des singes ou Riacho dos Macacos.

 





Oran é a segunda maior cidade da Argélia. Cidade portuária, mais de 400 quilómetros a Oeste de Argel, conserva muito da influência francesa.

A seguir a Catedral, do início do Século XX, e o ambiente urbano.





E uma Estação dos Correios que parece perdida no tempo:

 



 

                                Fotografias de 21 de Outubro de 2023

                                                                        José Liberato





segunda-feira, 15 de abril de 2024

São Cristóvão pela Europa (260).

 


 

O Hunsrück é um território do Estado alemão Renânia- Palatinado, entre os rios Mosela, Saar e Reno.

Existe uma chamada Catedral de Hunsrück situada numa elevação junto da localidade de Ravengiersburg.

A Catedral é imponente com duas torres de grande dimensão que datam da construção inicial, o Século XII. No local existiu desde 930 um castelo. Em 1070, o Conde Berthold, o proprietário, mandou construir uma capela já sob a invocação de São Cristóvão. Morrendo o Conde sem filhos, o conjunto foi transmitido ao Arcebispo de Mainz com a condição de o conjunto ser transformado num mosteiro. Data de 1074 a instalação dos frades agostinhos.

A vida destes frades será muito atribulada através das vicissitudes da Reforma, da ocupação por Espanhóis e Suecos durante a Guerra dos Trinta Anos, das invasões de Luís XIV e Napoleão.

Foi sede do Movimento dos Trabalhadores Católicos já no Século XX.

O Altar-mor é a jóia do interior da Catedral. Ostenta a data de 1722 e é tipicamente barroco. No seu topo uma pintura representando São Cristóvão.

 



 

A Igreja de Santa Maria e São Cristóvão de Bechtolsheim foi construída entre 1482 e 1487, pelo Mestre Jacob von Landshut que dirigiu posteriormente a construção da Catedral de Estrasburgo. Em 1544, a Igreja aderiu à Reforma. Mas em 1685 transformou-se numa Simultankirche ou Igreja Simultânea, ou seja, é utilizada tanto pela Igreja Protestante e como pela Igreja Católica.

À entrada da Igreja, um grande mural representa São Cristóvão.

O altar de Santa Maria apresenta um retábulo original com nove alvéolos numa disposição original.

Admite-se que as imagens tenham sido recuperadas de um altar antigo.

Na fila de baixo a Virgem Maria tem à Sua direita Seu pai, São Joaquim, e à Sua esquerda. Sua mãe, Santa Ana.

Na fila do meio da esquerda para a direita São Roque, São Cristóvão, São Jorge, São Leonardo e Santo Egídio.

Na fila de cima, São Jerónimo, Santa Bárbara, Santa Margarida e talvez São Martinho.

 




 

Finalmente, a Catedral de Worms, uma das mais importantes da Alemanha, construída no Século XII.

Local citado pelas lendas dos Nibelungos, onde existiu uma igreja desde o Século VII, palco da dieta de Worms em 1521 presidida pelo Imperador Carlos V e com a presença de Martinho Lutero.

Tem um grande fresco representando São Cristóvão.




 

                            Fotografias de 30 de Março de 2024

                                                                 José Liberato




domingo, 14 de abril de 2024

Argélia: o tempo da fraternidade? (18).

 


 

 

Em Tibhirine, a 95 quilómetro a Sul de Argel situa-se o Mosteiro de Nossa Senhora do Atlas.

Criado por monges trapistas em 1939, desenvolveu desde então uma acção importante no desenvolvimento agrícola da Região onde se implantou. O mosteiro sempre teve uma atitude ecuménica, ao ponto de, na falta de uma mesquita na aldeia vizinha, ter cedido as suas próprias instalações para os muçulmanos exercerem o seu culto.

Ficaria dramaticamente célebre na noite de 26 de Março de 1996.

Em plena Guerra Civil, um comando de terroristas tomou facilmente o mosteiro e raptou quase todos os monges. Nunca mais foram vistos com vida. Os seus corpos foram encontrados sem cabeça um mês depois. Nunca foram identificados os perpetradores do crime.

Hoje, respira-se no mosteiro um ambiente tranquilo, embora a memória do acontecido esteja presente. Ainda hoje, e não obstante a convivência com as populações locais persistir, os monges só vão à aldeia, por exigência das autoridades, sob escolta policial.

Curiosamente, o sino só é autorizado uma vez por ano, no dia de Páscoa.

 







 

                                    Fotografias de 19 de Outubro de 2023

 

                                                                          José Liberato


segunda-feira, 8 de abril de 2024

São Cristóvão pela Europa (259).

 


 

Nos últimos dias do mês de Março dei uma pequena volta pela Alemanha. O meu percurso abrangeu os Estados da Renânia-Palatinado, de Baden-Württemberg, de Hesse e da Baviera. Sempre que me cruzei com o nosso São Cristóvão não deixei de me documentar.

Comecei pela cidade de Mainz que se pode traduzir em português por Mogúncia, capital do Estado da Renânia-Palatinado cujo ex-libris é certamente a Catedral.



Mas durante mil anos ergueu-se na cidade uma Igreja de São Cristóvão. Contudo em 1942 e 1945, a II Guerra Mundial não a poupou. Hoje encontra-se reconstruída uma pequena parte, ficando intencionalmente em ruína o restante, como memória da Guerra. Aqui foi baptizado por volta de 1400 uma das grandes personalidades da cidade: Johannes Gutenberg (1400-1468), o inventor do método de impressão que viria a revolucionar a produção de livros.

 

Existe uma reconstituição do que seria um fresco de cerca de 1400. O interior da Igreja com iconografia do nosso Santo só se consegue aperceber através de uma fotografia longínqua e com muitos reflexos.

 






O Landesmuseum Mainz é um dos grandes museus da cidade e um dos mais antigos da Alemanha. Está instalado num edifício barroco, antes afecto a uso militar.

 


O museu apresenta uma imagem de madeira da autoria de um Mestre Anónimo de 1490:

 


Em Bacharach, nas margens do rio Reno, a Igreja de São Pedro tem um mural representando um São Cristóvão de grande dimensão com o Menino Jesus ao colo e atravessando um rio com um cajado nas mãos. Deve ter sido pintado no Século XIV.

 

 



 

                                    Fotografias de 30 de Março de 2024

                                                                     José Liberato




domingo, 7 de abril de 2024

Carta de Bruxelas.




 


Para assinalar seis meses passados sobre o dia 7 de Outubro de 2023

 

Jacques Maritain, o filósofo francês que inspirou o personalismo cristão e que tanta influência exerceu no catolicismo social, viveu alguns anos exilado nos Estados Unidos da América durante a guerra. Entre 1941 e 1944 proferiu várias alocuções radiofónicas dirigidas à França ocupada. Em 1945, passadas a escrito, essas palavras de esperança e de solidariedade foram editadas com o título Messages 1941-1944. Uma delas, com o número XXV e difundida a 5 de Janeiro de 1944, tinha como título A Paixão de Israel. Nela lê-se: «Hoje uma testemunha dos Massacres de Kharkoff em 1941 contou que no campo onde os alemães haviam reunido os judeus antes de os enviarem para a morte, uma mulher judia entrou em trabalho de parto na noite de Natal; e suplicou a Deus: faz que eu dê à luz um bebé morto, para que não seja morto pelos homens.»

Já foi assim.

 

                                                                    João Tiago Proença


quinta-feira, 4 de abril de 2024

Porventura o testemunho mais eloquente sobre a guerra colonial e o depois.

 


Porventura o testemunho mais eloquente sobre a guerra colonial e o depois,

Palma de ouro para a literatura nas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril

 

 

Carlos de Matos Gomes, escritor que usa o pseudónimo de Carlos Vale Ferraz, autor do mais importante romance da literatura da guerra colonial, inverte as regras do jogo, nada de equidistâncias, vem-nos confidenciar o que naquela guerra colonial onde ele percorreu Angola, Moçambique e Guiné perdera todo e qualquer sentido, daí ter participado, desde a primeira hora, na formação do núcleo do MFA na Guiné, aquele que, na manhã do dia 26 de abril, com a representatividade de todos os ramos das Forças Armadas, depôs o então comandante-chefe, o primeiro sinal que foi dado no território para abertura de conversações com os insurgentes que já tinham declarado unilateralmente a independência; desvela a sua intimidade, interroga-se sobre as causas que o tinham conformado, aos 24 anos, no posto de capitão comandante de uma companhia de tropas especiais, a fazer aquela guerra, onde se sentia literalmente o intruso, e onde descobrira, que o colonialismo estava vivo e bem operante; combate ao lado de rodesianos, descobrirá depois do 25 de Abril que há um acordo secreto entre o Estado Novo e as forças do Apartheid…

É uma dobadoira de confidências de um combatente valoroso, condecorado com duas cruzes de guerra, que nos vai envolver com o mundo da sua infância, como chegará à academia militar, os sonhos que guarda. A Guiné é crucial, para ela se ofereceu voluntariamente, acabará como autoridade no Batalhão dos Comandos Africanos, assiste a uma etapa superior da africanização da guerra, considera que Spínola foi até onde a sua natureza lhe permitiu, um general destemido que descobriu que não havia nenhuma solução militar para um conflito onde os nacionalistas tinham um pé firme no território, eram beligerantes e ao nível do combate no terreno possuíam melhor armamento, isto até 1973, aí as coisas mudaram de figura. Matos Gomes acompanha de 1972 a 1974 a trepidação do conflito, recorda os acontecimentos subsequentes ao assassínio de Amílcar Cabral e ao conjunto de operações de maio de 1973, haverá um quartel totalmente cercado no Norte da Guiné, Guidage, pôs-se em movimento uma operação de nome Ametista Real para aliviar a pressão, que teve sucesso. “O Batalhão de Comandos Africanos sofreu 10 mortos, 22 feridos graves e 3 desaparecidos. Entre os feridos, o capitão Folques, que conseguimos trazer. E provocou 67 mortos, entre os quais, segundo refere uma informação obtida da República do Senegal, uma médica e um cirurgião cubanos e quatro mauritanos.”

E há outros dados significativos: “Durante o mês de maio de 1973, as forças portuguesas sofreram 63 mortos, 269 feridos e um prisioneiro; o PAIGC realizou 166 ataques, ocupou uma base militar, sede de um comando operacional, Guileje, efetuou 36 emboscadas, 12 ataques contra aeronaves e um contra embarcações, implantando 105 minas, das quais 66 foram acionadas por militares portugueses.” O descontentamento militar está em fermentação. Costa Gomes e Spínola acordam em junho em trocar espaço por tempo, ninguém tem ilusões de que tudo se vai agravar, é preciso encolher o dispositivo militar. “A situação aconselhava ao retraimento do dispositivo militar português, que deveria ficar com todas as unidades aquém da linha geral rio Cacheu-Farim-Fajonquito-Paunca-Nova Lamego- Aldeia Formosa-Catió, para evitar o aniquilamento das guarnições de fronteira. Esta solução de último recurso tem sido apresentada como prova de que, no seu regresso a Lisboa, Costa Gomes considerou a situação da Guiné como controlável e o território defensável; no entanto, ela é a clara admissão de que as forças portuguesas abdicavam da posse de boa parte do território da Guiné e das suas populações para se concentrarem no reduto central. A soberania portuguesa seria assim apenas formal, militar e politicamente indefensável. O Governo português sujeitava as Forças Armadas a uma situação humilhante e o país a uma situação de vexame internacional.”

Dá-nos a sua versão do nascimento do MFA, descreve a Guiné nos primeiros meses de 1974, o que foi o 26 de abril em Bissau e em toda a Guiné, o memorialista desembarca em Lisboa em junho de 1974, tem o PREC à sua espera, tudo contado com algumas pitadas de humor, a relação forte que estabeleceu com Jaime Neves, o encaminhamento para o 25 de novembro, não é dúbio nem se mostra atarantado, aderiu à esquerda revolucionária, não guarda mágoas nem pôs em salmoura quaisquer traumas, desfia as suas considerações sobre o processo político, dizendo-se solista da sua própria orquestra. É chamado ao Conselho Superior de Disciplina do Exército, entra como réu, sai absolvido. “Existia um MFA ao qual eu já não pertencia, um país que seguia o seu novo rumo e eu via-me no rasto da espuma que ele deixava.” Deixa gravado que acreditou no poder popular e que numa hora de descaminho que ele se afastou.

A firmeza das suas ideias compagina-se com a firmeza de como escreve, não descura a aprendizagem do dever e da solidariedade. “A história da minha geração fez-se ao redor da fogueira da guerra. O dilema da minha geração incluía sempre a minha decisão sobre a guerra. A guerra surgia como um fenómeno que atingiu Portugal porque ocorrera uma tempestade no mundo. Como as invasões francesas, ou a peste bubónica. Portugal defendeu-se da intempérie. Neste caso, Salazar não conseguiu preservar Portugal das turbulências históricas, como conseguira na Segunda Guerra Mundial, e a sua costela de camponês levou-o a defender à sacholada o que entendia ser a sua propriedade. Esta era ainda, nos anos 90, a narrativa sobre a guerra. A dificuldade em a desmontar era tanta que essa guerra nem tinha designação, além da antiga “Guerra do Ultramar – um conceito, o do Ultramar, que tanto fora utilizado pelos liberais como pelo Estado Novo, que a partir de 1951 alterara a designação de colónias para províncias ultramarinas”.

É caloroso na amizade e despede-se de nós com um parágrafo esplendente:

“Num tempo de obediências e corrupções, num tempo de sombras e homens sombrios, num tempo de funcionários, de gente que não dá ponto sem nó, que nunca faz o que deve sem perguntar o que ganha com isso, eles, os meus, pertencem a uma casta de seres humanos que nos servem de matriz. Sementes raras, que por vezes dão frutos ásperos, mas apaixonantes.”

Tenho dúvidas que possa surgir um testemunho mais vigoroso sobre o arco histórico e o dilema de uma geração, a que também pertenço.


                                                                                           Mário Beja Santos









 


quarta-feira, 3 de abril de 2024

Argélia: o tempo da fraternidade? (17).

 


 

O livro Noces (Núpcias) de Albert Camus (1913-1960), Prémio Nobel da Literatura em 1957, é composto de quatro partes uma das quais é Noces à Tipasa (Núpcias em Tipasa). Aí revela-se um admirador das ruínas romanas e da sua relação com o Mediterrâneo

Por isso, foi erigida uma estela de homenagem ao escritor no sítio arqueológico de Tipasa. Na estela estão gravadas as seguintes palavras: Compreendo aqui o que se chama glória, o direito de amar sem limites

 


  

O teatro é outro dos monumentos fundamentais do sítio arqueológico. Do Século II-III, caracteriza-se por ser um teatro de planície, onde o desnível é pequeno.

 




A Grande Basílica Cristã do fim do Século IV tem a dimensão excepcional de quase 60 metros por 25 metros.

 




Finalmente, a cidade dispunha de uma fábrica de garum.

O garum era um produto gastronómico muito apreciado pelos romanos. Tratava-se de um tempero, uma salmoura feita de restos, sangue e vísceras de peixe, cuidadosamente esmagados em tanques de grande dimensão.

 


 

                            Fotografias de 18 de Outubro de 2023

                                                                     José Liberato





segunda-feira, 1 de abril de 2024

Bruxelas.

 






                                                                                Fotografias de João Tiago Proença